A justiça é um dos pilares fundamentais de qualquer sociedade, mas sua aplicação nem sempre segue um caminho reto e previsível. O filósofo e matemático Blaise Pascal (1623-1662) refletiu profundamente sobre a natureza da justiça e chegou a uma conclusão inquietante: em muitos casos, a justiça humana não é guiada por uma verdade absoluta, mas sim por costumes, convenções e pelo poder.

No Brasil, onde o sistema judiciário enfrenta desafios como interpretações divergentes da lei, desigualdade no acesso à justiça e insegurança jurídica, as reflexões de Pascal permanecem surpreendentemente atuais. Até que ponto a justiça brasileira reflete essa visão pascaliana?

A Justiça como convenção e poder

Pascal afirmava que o que chamamos de "justiça" muitas vezes não passa de uma construção social, determinada pelo contexto histórico e pela força daqueles que a impõem. Ele dizia que, se a justiça fosse absoluta, ela seria reconhecida universalmente. No entanto, o que é considerado justo em uma sociedade pode não ser em outra, o que mostra sua natureza relativa.

No Brasil, essa ideia se manifesta na maneira como as leis são aplicadas de forma desigual. Enquanto algumas pessoas enfrentam processos longos e punitivos, outras conseguem evitar condenações devido a bons advogados, influência política ou brechas na legislação. O poder, seja econômico ou político, muitas vezes dita quem realmente tem acesso à justiça.

A fragilidade da razão e a interpretação da Lei

Outro ponto essencial do pensamento de Pascal é a limitação da razão. Ele acreditava que os seres humanos tentam justificar suas decisões racionalmente, mas essas justificativas podem ser contraditórias e variar conforme o contexto.

Essa fragilidade da razão aparece no sistema judiciário brasileiro, onde juízes podem interpretar a mesma lei de maneiras diferentes. O que é considerado um crime grave por um magistrado pode ser relativizado por outro, resultando em decisões opostas para casos semelhantes. Isso gera insegurança jurídica, pois os cidadãos não sabem exatamente o que esperar do sistema de justiça.

A aposta de Pascal e a Justiça Brasileira

A "Aposta de Pascal" é uma das suas ideias mais conhecidas: diante da incerteza sobre a existência de Deus, ele argumentava que a melhor escolha era acreditar, pois as vantagens superavam os riscos. Essa lógica também pode ser aplicada ao sistema jurídico brasileiro.

Advogados e cidadãos, ao invés de confiarem na previsibilidade das leis, frequentemente fazem "apostas" com base nas tendências dos tribunais e nas interpretações jurídicas mais convenientes para seus casos. Essa incerteza reforça a ideia de que a justiça não é uma ciência exata, mas um jogo de probabilidades, onde o conhecimento das brechas legais e das decisões anteriores pode ser mais importante do que a própria verdade.

Conclusão

As reflexões de Pascal sobre a justiça nos ajudam a entender melhor as fragilidades do sistema jurídico brasileiro. Se a justiça é frequentemente moldada pelo poder, pela interpretação subjetiva da lei e por apostas estratégicas, isso significa que ela está longe de ser um ideal absoluto.

Diante desse cenário, é fundamental buscar um sistema jurídico mais coerente e acessível para todos, minimizando as influências do poder e garantindo maior previsibilidade nas decisões. Afinal, se a justiça continuar a depender mais de convenções e interesses do que de princípios sólidos, ela corre o risco de se afastar da sua verdadeira função: garantir equilíbrio e equidade para a sociedade.

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